A poesia, como tem sido dito, difere, neste respeito, da lógica, na medida em que não está sujeita ao controle das forças activas do espírito, e em que o seu nascimento e recorrência não possuem uma conexão necessária com o inconsciente ou a vontade. É presunção determinar que estas são condições necessárias de toda a causação mental, verificada a insusceptibilidade de se lhes referir os efeitos mentais. A frequente recorrência do poder poético - é evidente supor-se - pode produzir no espírito um hábito de ordem e harmonia correlativo com a sua própria natureza e seus efeitos nos espíritos.
Mas, nos intervalos da inspiração - e estes podem ser frequentes sem que sejam duradoiros - o poeta torna-se um homem vulgar e fica abandonado ao súbito refluxo das influências, sob as quais os outros habitualmente vivem. Mas como ele é mais delicadamente organizado do que os outros homens, e sensível à dor e ao prazer - seus e dos outros - num grau que a estes é desconhecido, ele evitará uma e perseguirá o outro, com um ardor proporcional a esta diferença. E ele expor-se-à à calúnia, se deixar de observar as circunstâncias sob as quais estes objectos de perseguição e fuga universais se disfarçam com as indumentárias de cada um deles. (...)
Pensei ser mais favorável à causa da verdade registar estas observações conforme a ordem em que me acudiram à mente, considerando o tema, em vez de observar a formalidade de uma réplica polemística; mas, a ser justo o asserto nelas contido, verificar-se-á envolverem uma refutação aos detractores da poesia, pelo menos no que se refere à primeira parte do assunto. (...)
Shelley in Defesa da Poesia
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