17 dezembro 2014

Espiral

Um só poema basta para atingir a terra,
caminho de todos os poemas,
sinal de todas as graças,
poço de todas as águas,
tenham ou não tenham olhos que as  chorem.

Oh poema caminhando ao encontro
de uma seiva tranquila
em canalículos de virgindade activa!
Oh poema suposto inevitável
enquanto homens desistem e se apaguem!
Graça de morte para uma ideia nascente,
olhar de torre antiga,
sobranceira ao adro restaurado…

Aqui era uma fonte.

Que os homens entendam,
que os homens lutem,
que os homens esmaguem
os sinais inventados.

O poema vem descendo e cruza-se com outros.

Aqui nunca houve rio.

E o poema filtra-se de perto,
deixando à superfície
uma ligeira espuma poética representando o poeta
de olhos abertos para a espiral do tempo.

Jorge de Sena in Antologia Poética

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