24 janeiro 2014

Repousam os Celeiros

Repousam os celeiros
Não se atreve a espiga às guilhotinas do trigo,
a uma estação de laminas rasas.

Hoje é o primeiro dia e aqui me sento.
Abarco prados, sebes,
sulcos que devastam uma região semeada, crescendo;
candeeiros que acendem os baldios, qo longe.

Ele vai por esse lado, pela música dos últimos pátios.
Escutará deus a intempérie dos violinos?
Os acordes de um porto,
o desvario?
Escutará deus a sua palavra?

Eia a água, as águas,
os afluentes destas margens quando nos despimos:
fragas, farpas, foices cujo talento cerceia os braços,
as vides onde o verde esmorece, liquidamente.

Repousam os celeiros.
Repousa o feno.
Não ousará o amor quem porfia no inverno das mãos.
Um corpo é como um bosque frio se dos seus ramos não se desprende a luz.

Eu descubro as cinzas.
Gotas, pérolas que vi iluminadas pelos relâmpagos do
terror,
arados que removem as moradas da terra,
galerias que nos curvam para baixo,
para sempre.

Ele escreve.
Atreve-se à pena às penas, dilacera os instantes de
uma vida,
o fio das espadas -
é errante o verso entre as casas.

José Agostinho Baptista in Biografia

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