15 outubro 2013

"Há, de facto, homens-oceanos.
Estas ondas, este fluxo e este refluxo, este vaivém terrível, este ruído de todos os sopros, estas negritudes e estas transparências, estas vegetações que pertencem à voragem, esta demagogia das névoas em pleno furacão, estas águias na espuma, estes maravilhosos seres de astros repercutidos não sabemos em que misterioso tumulto por milhões de cimos luminosos, cabeças confusas do inumerável, estes grandes raios errantes que parecem estar à espreita, estes soluços enormes, estes monstros vislumbrados, estas noites de trevas cortadas por rugidos, estas fúrias, estes frenesis, estas tormentas, estas rochas, estes naufrágios, estas frotas que chocam umas com as outras, estas trovoadas humanas que se misturam com as trovoadas divinas, este sangue no abismo; e depois estas graças, estas suavidades, estes festejos, estas alegres velas brancas, estes barcos de pesca, estes cantos no fragor, estes portos esplêndidos, este fumegar da terra, estas cidades no horizonte, este azul profundo da água e do céu, este amargor útil, este azedume que saneia o universo, este sal áspero que tudo deixaria apodrecer se não existisse; estas cóleras e estas inquietações, este todo em um, este inesperado no imutável, este prodígio vasto da monotonia inesgotavelmente diversa, este nivelamento depois da perturbação, estes infernos e estes paraísos da imensidade para sempre enternecida, este infinito, este insondável, pode tudo isto estar num espírito, e chama-se então génio a esse espírito e tereis Ésquilo, tereis Isaías, tereis Juvenal, tereis Dante, tereis Miguel Ângelo, tereis Shakespeare, e olhar para estas almas é como olhar o Oceano".

Vitor Hugo in Os Génios

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