24 junho 2012

Dreamtigers

"Na infância exerci com fervor a adoração do tigre: não a do tigre fulvo dos camalotes do Paraná e da confusão amazónica, mas a do tigre raiado, asiático, real, que só podem enfrentar os homens de guerra sobre um castelo, em cima de um elefante. Costumava deter-me sem fim diante de uma jaula do Jardim Zoológico; apreciava as vastas enciclopédias e os livros de história natural pelo esplendor dos seus tigres. (Recordo-me ainda dessas figuras: eu, que não posso lembrar-me sem erro da testa ou do sorriso de uma mulher.) Passou a infância, caducaram os tigres e a sua paixão mas ainda estão nos seus sonhos. Nessa napa submersa ou caótica continuam a prevalecer e se não veja-se: adormecido, distrai-me um sonho qualquer e logo sei que se trata de sonho. Costumo então pensar: isto é um sonho, uma pura diversão da minha vontade, e já que tenho um ilimitado poder, vou causar um tigre.
Ó incompetência! Nunca os meus sonhos sabem engendrar a apetecida fera. Aparece o tigre, isso sim, mas dissecado ou débil, ou com impurações de forma, ou de um tamanho inadmissível, ou muito fugaz, ou parecido com um cão ou um pássaro".

Jorge Luis Borges in Obras Completas II

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