Para Carol, que no malecón de Havana
suspeitava que o vento do Norte
não era totalmente inocente.
No outro dia instalei uma fábrica de furacões na costa da Florida, que se presta por tantas razões, e fiz entrar em acção os helicóides turbinantes, os projecta-rajadas a neutrões comprimidos e os torvelinhadores de suspensão coloidal, tudo ao mesmo tempo para fazer uma ideia de conjunto sobre a performance.
Pela rádio e a televisão foi fácil seguir a rota do meu furacão (reivindico-o expressamente porque nunca faltam outros que se podem qualificar como espontâneos), e aí te quero ver porque o meu furacão se enfiou nas Caraíbas a duzentos à hora, reduziu a pó uma dezena de escolhos, todas as palmeiras da Jamaica, torceu inexplicavelmente para Leste e perdeu-se para os lados de Trinidad arrebatando os instrumentos a numerosos steel bands que participavam num festival adventista, tudo isto entre outros danos que me impressiona um pouco pormenorizar porque aquilo que me agrada é o furacão em si mesmo, mas não o preço que cobra para ser verdadeiramente um furacão e colocar-se elevado no ranking homologado pelo British Weather Board.
Entretanto a senhora de Cinamomo veio repreender-me, porque tinha estado a ouvir as notícias e nelas falava-se com termos tirados do mais baixo sentimentalismo radial tais como destruição, devastação, gente sem abrigo, vacas propulsadas para o cimo de coqueiros e outros epifenómenos sem nenhuma gravitação científica. Fiz notar à senhora Cinamomo que, relativamente falando, ela era muito mais nociva e devastadora para o marido e as filhas do que eu com o meu bonito furacão impessoal e objectivo, ao que me respondeu tratando-me por Átila, patronímico que não me agradou nada, vá-se lá saber porquê, já que na realidade soa bastante bem. Átila, Atilita, Atilinho, Atilíssimo, Atilão, Atilango, repare-se que todas as variantes são bonitas.
Julio Cortázar in Papéis Inesperados
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